segunda-feira, 18 de junho de 2012

Deus imanente - Adenáuer Novaes


“Não se turbe o vosso coração; crede em Deus, crede também em mim. Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se assim não fora, eu vo-lo teria dito. Pois vou preparar-vos lugar.” João, 14:1 e 2.

Muito óbvio que entendamos as moradas de Deus como sendo os diversos mundos, habitados ou não,  no Universo, Sua “casa”. Tais mundos, nos quais alguns cientistas afirmam existir vida, são servidos  por bilhões de estrelas que a ciência de hoje identifica. A ‘casa’ de Deus é o Universo infinito, onde os diversos corpos celestes e o próprio espaço coexistem em harmonia. Colocamos entre aspas, pois o termo se aplica à uma morada física, portanto não se aplica concretamente a Deus.

Como Deus não se confunde com o Universo, sendo este Sua criação, Ele também se encontra fora dele. Dessa forma, Deus está em toda parte, dentro ou fora do Universo, se é que existe dentro e fora em se tratando d’Ele. Estando Deus em qualquer parte do Universo, também estará no interior do ser humano. Considerando que o mundo interior da alma humana é também um lugar onde Ele está, podemos dizer que ali pode ser Sua morada.

O que chamamos de essência divina no ser humano, como em todas as coisas, é a presença de Deus no Universo. Ele atua  no universo, indiretamente, através de Suas leis e, diretamente, no interior do ser, no seu mundo psíquico. Somos deuses por abrigarmos Deus em nós. Eu  sou deus na medida em que reconheço Sua existência real em mim, na minha singularidade. Minha casa mental é morada de Deus. Em meu psiquismo, que evolui sem cessar, existe uma parte singular, que é o selo de Deus em mim mesmo.

Deus está na singularidade da  psiquê. O Eu profundo ou a individualidade humana é Deus no ser humano. Sua percepção não se dá apenas  pelo intelecto ou tão somente pela fé, mas, principalmente, pelo sentimento. É possível sentir Deus em si mesmo. Não é um ato isolado da fé, nem da razão, mas da emoção superior do Espírito.

Para sentir Deus em você, é necessário que se desenvolvam faculdades emocionais a partir da vivência em experiências que o coloquem em provas que despertem os sentimentos nobres latentes do Espírito. Vivenciar experiências como:

a doação desinteressada,
o amor ao próximo,
a caridade anônima,
o carinho fraterno,
a amorosidade para com as pessoas,
a alegria sincera,
a amizade sentida,
lidar com a inocência da criança,
admirar a natureza,
devolver a esperança a alguém,
sentir a presença espiritual de um ente querido,
perceber o crescimento de um ser vivo,
sentir a espiritualidade na Vida,
sentir a saudade construtiva,
sentir, com empatia, no lugar de alguém,
refletir ao som de uma música elevada,
orar e perceber a resposta de Deus.

Psicologicamente, podemos entender que as moradas de Deus são os estados da alma nos seus diversos níveis evolutivos. Como estou interiormente, como manifesto meu mundo interior, como atuo no mundo, como o mundo atua sobre mim, tudo isso reflete aspectos da personalidade que sou e identificam estados psíquicos.

Para perceber a personalidade do indivíduo é preciso avaliar sua vida no sentido amplo da palavra. Alguns aspectos não se exteriorizam na consciência, permanecendo inconscientes. Quando o Espírito reencarna, não apresenta toda a sua personalidade. Só exterioriza aquilo que o meio estimula, bem como o que ele necessita para evoluir naquela encarnação. Certas qualidades e alguns aspectos aversivos da personalidade não encontram campo propício à manifestação. Há personalidades muito complexas, cujo desequilíbrio necessita de várias encarnações para encontrar a harmonia. Não se pode determinar a personalidade de alguém a partir de um simples comportamento. O ser humano é mais do que demonstra. As pessoas não devem ser vistas pela atitude de um momento, pois esta é fruto apenas da vontade do Espírito submetida às circunstâncias ocasionais externas.

Nesse sentido, é necessário separar o Espírito de sua atitude externa. O ato externo é uma expressão da personalidade, mas não ela em si. É apenas uma faceta do Espírito. As moradas de Deus se expressam de formas distintas a depender de fatores complexos que determinam os atos humanos; dentre eles, a vontade pessoal, as circunstâncias ambientais externas, as influências psíquicas a que está submetido, o sentido evolutivo superior da vida, a proximidade de pessoas e fatos futuros pressentidos, os sentimentos aflorados, etc.

Os estados psíquicos do Espírito são infinitos e variam de acordo com seu grau de evolução. Os estados de consciência expressos nos registros eletroencefalográficos, Beta,  Alfa,  Theta e Delta, são resultantes indiretos das vibrações psíquicas do Espírito. São um pequeno resumo da multiplicidade dos estados psíquicos do Espírito. O Espírito vibra em faixas que se constituem num espectro ou mosaico de expressões que extrapolam nossa compreensão limitada. Esse mosaico se constitui na presença de Deus no Espírito. São as moradas de Deus em nós.

As moradas são os estados de espírito, são expressões da alma na Vida. As manifestações da personalidade são expressões de Deus no ser humano. Quando nos envolvemos com nosso mundo íntimo, à procura de idéias, de pensamentos, de emoções e de intuições, estamos buscando as expressões de Deus em nós. Respeitar, portanto, cada ser humano, é reverenciar a Deus. As máscaras sociais de que nos utilizamos para viver em sociedade são também representações dos estados psíquicos internos, são expressões simbólicas da alma, arremedos da face de Deus. Essas máscaras são personalidades artificiais, ou personas, que nos servem para estabelecermos a necessária ligação do  interno com o externo e vice-versa.

As sucessivas encarnações do Espírito possibilitam a utilização de várias expressões da personalidade que ficam arquivadas no inconsciente. Essas vidas passadas deixam marcas no perispírito, permanecendo como formas de atuação, ou tendências comportamentais, frente às situações semelhantes que o Espírito venha a viver no presente. Vez por outra o Espírito se utiliza dessas facetas que são, sob nossa ótica, manifestações das moradas de Deus em nós. Usamos várias  personas para viver em sociedade. As vidas sucessivas nos possibilitam utilizar várias formas comportamentais de acordo com nosso estado de espírito. Muitas vezes nos deixamos influenciar pelas características marcantes da personalidade dessa ou daquela encarnação, inibindo o surgimento de uma nova, alicerçada sob valores morais e éticos superiores. Repetimos mais do que criamos, pois utilizamos a persona que melhor possibilitou uma boa convivência social no passado. Tentar inibir esse atavismo, que funciona à maneira de um arquétipo, é proceder a reforma ou transformação da personalidade. 


Na Terra, ainda precisamos do mal para sentirmos o bem; da noite para admirarmos a luz; da doença para apreciarmos a saúde; ainda precisamos das personas para conviver em sociedade. Sem elas nossa sombra aparece, tornando-nos insuportáveis. A conciliação dessa dialética de opostos é fundamental para o crescimento espiritual do ser humano. Harmonizar esses estados psíquicos interiores é tarefa do Espírito no caminho de sua evolução. Tentar separar uns dos outros é como querer separar os lados de uma moeda, como se fosse possível ela existir com um único lado.

Durante as encarnações alicerçamos aspectos negativos, aversivos, que ficam encobertos como uma sombra. Esses aspectos da personalidade não podem ser desprezados como sendo também moradas do Espírito. Esquecer essa sombra que todos temos, e nem sempre enxergamos, é subestimar a riqueza da vida inconsciente. Ao afirmar ‘não se turbe o vosso coração’, isto é, não se aflija, não acalente culpas e pesares desnecessários, ele estaria dizendo que há muitas possibilidades, como muitas moradas e alternativas para se exteriorizar o que se sente. Há muitas escolhas possíveis, não sendo necessário esforçar-se para se enquadrar em uma norma externa ou num dogma, nem recriminar-se por não conseguir atender a um tipo de comportamento ideal. Para iluminar sua consciência, a pessoa pode dispor dos caminhos que originalmente se enquadram ao seu momento evolutivo e à sua capacidade de discernimento.

O  Cristo colocou que iria preparar o lugar onde ele também estaria. Esse lugar é o estado de consciência feliz e harmonizado do Espírito consigo mesmo, com o outro, com a Vida, com a Natureza e com Deus. Psicologicamente o Self individual orientará a personalidade para a realização de sua totalidade espiritual. Isso é possível ainda na Terra, enquanto estamos encarnados.

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