quarta-feira, 5 de março de 2014

Ética, Direito e Espiritismo

“quem é ético certamente nunca terá problemas
com a lei nem com a justiça"


Você já parou para imaginar um mundo dirigido apenas pela Ética? Um mundo onde não existissem códigos, nem crimes e castigos? No futuro a Terra será assim, mas por enquanto o Direito, que é um conjunto de regras obrigatórias visando garantir a convivência social, estabelecendo limites à conduta de cada um dos integrantes de determinada comunidade, ainda é necessário e indispensável, pois sem ele os agrupamentos sociais não conseguiriam subsistir, uma vez que haveria o império da anarquia e da desordem, como bem lembrou o Professor Miguel Reale, em suas Lições Preliminares de Direito.
Por seu turno, o filósofo inglês Jeremias Bentham, procurando diferenciar Moral e Direito, desenvolveu a “teoria do mínimo ético”, segundo a qual as normas éticas seriam suficientes para regular a vida em sociedade. Entretanto, como nem todos querem ou podem cumpri-las na plenitude, foi preciso tornar obrigatória a observância de um mínimo de Moral. Essa teoria pode ser representada por dois círculos concêntricos, sendo que o círculo externo é a Moral e o interno é o Direito. Assim, “tudo o que é jurídico é moral, mas nem tudo o que é moral é jurídico”.


Para melhor entender essa doutrina, consideremos como Ética a investigação dos princípios que motivam, distorcem, disciplinam e orientam nossa conduta, buscando com isso manter ou modificar o nosso comportamento para alcançar o máximo de perfectibilidade possível, o que certamente implica na tentativa de superar paixões e desejos irrefletidos.


O ideal seria fazer isso sozinho, sem necessidade de condicionamentos extra-humanos, de origem religiosa, filosófica ou política, através da ética autônoma, que considera o ser humano um legislador livre e consciente do conjunto de normas e leis morais que adota em sua existência social.


Porém, como a maioria esmagadora das pessoas ainda é incapaz de estabelecer, com suas próprias forças, um conjunto de regras e leis morais apto para atingir a perfeição necessária, procura então socorro na chamada ética heterônoma, que em geral é de natureza filosófico-religiosa, segundo a qual os imperativos éticos são originários de fontes naturais ou divinas e que transcendem a livre autodeterminação do ser humano.


Efetivamente, o código de ética de cada pessoa é formado desde a mais tenra idade, através dos pais e educadores, por meio do sistema de punições e recompensas. Assim, quando pais e religiosos são rigorosos, costumam incutir em seus filhos regras severas, que resultarão em adultos dominados por um controle interno implacável, que normalmente impede que eles sejam criativos pela falta de espontaneidade. Na situação oposta, ou seja, pais que não têm princípios morais saudáveis, acabam permitindo que seus filhos cresçam sob o influxo dos instintos, que em geral são animalescos, e com isso geram adultos sem freios para suas paixões inferiores.


Diante dessas situações antagônicas, é aconselhável que pais e educadores desenvolvam um mínimo de consciência ética, para que assim consigam educar seus filhos e alunos dentro de padrões morais que lhes permitam viver em sociedade com desenvoltura, pois quem é ético certamente nunca terá problemas com a lei nem com a justiça.


Nesse ponto, o Espiritismo exerce papel fundamental, ensinando que o verdadeiro espírita será sempre reconhecido pela sua “transformação moral e pelos esforços que emprega para domar suas inclinações más” (item 4, cap. XVII, de O Evangelho segundo o Espiritismo). Além disso, Allan Kardec, em nota à questão 685 de O Livro dos Espíritos, assevera que a educação não é só a transmissão de lições dos livros, mas que consiste na arte de formar o caráter, de incutir hábitos, pois educação é o conjunto dos hábitos adquiridos. Portanto, aqueles que ainda não conseguiram formar a sua ética autônoma e precisam de auxílio para elaborar um conjunto de regras e leis morais para adotar em sua vida pessoal, por certo encontrarão no Espiritismo todos os imperativos éticos suficientes para atingir a perfeição necessária, começando na atual experiência e prosseguindo em futuras encarnações.
E para encerrar, reflitamos sobre este precioso pensamento de Potter Stewart: “A pessoa ética, freqüentemente, escolhe fazer mais do que a lei exige e menos do que a lei permite”.


Eliseu Mota Júnior é promotor de Justiça aposentado, advogado e professor universitário.
Artigo publicado na Revista Internacional de Espiritismo, edição de Junho de 2005

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