sábado, 8 de dezembro de 2012

Escolhas - Adenáuer Novaes

“Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de aborrecer-se de um e amar ao outro; ou se  devotará a um e desprezará ao outro. Não podeis servir a Deus e às riquezas."  Lucas, 16:13.

Servir a um senhor é estar sintonizado com seus objetivos como também estar à disposição para seguir suas orientações. Como disse Jesus, ninguém consegue seguir a dois senhores por se tratarem naturalmente de orientações que se opõem. As riquezas  representam a materialidade, e Deus a espiritualidade da Vida.

É evidente a colocação do confronto de opostos que devem se constituir em elementos de escolha para o ser humano. Ao se escolher um, naturalmente estar-se-á negando o outro. Um dita um tipo de  caminho, o outro, a direção oposta. Este é o tema básico da epígrafe: escolhas.

Sempre estamos submetidos a momentos em que temos que fazer escolhas, entre situações que se opõem ou mesmo que se assemelham. Às vezes, queremos as duas, porém não é possível,  ou mesmo desejável. O importante é sabermos que temos que aprender a fazer escolhas e assumir as conseqüências da opção feita. Quando optamos por algo devemos ter consciência de que estamos renunciando a outra coisa. Nem sempre queremos renunciar à opção  que não escolhemos e que também nos parecia boa. É uma arte aprender a renunciar, pois, ao fazê-lo, estaremos também aprendendo a administrar perdas. Sempre estaremos ‘perdendo’ alguma coisa na vida quando nos achamos possuidores de algo. Devemos aprender a perceber que não possuímos nada nem ninguém.

Antes de reencarnar devemos optar por determinadas situações a enfrentar (provas ou expiações), como processos educativos a fim de evoluir. Já reencarnados, antes do processo se efetivar, ainda na infância, começamos a optar quanto aos vínculos que queremos manter (em geral opta-se pelo materno, isto é, pela necessidade de ser acolhido); na adolescência, surge a necessidade da escolha profissional e dos relacionamentos afetivos; no início da idade adulta, temos  que optar pela relação amorosa; na maturidade, além de aprender a administrar as perdas comuns dessa fase, temos que escolher quais ciclos e processos temos que fechar, isto é, concluir; na velhice, a avaliação que normalmente se faz da própria vida influencia as escolhas que se podem fazer quanto à forma de se viver essa fase, dominada, via de regra, pelas preocupações com a própria morte.

A colocação do Cristo nos leva a entender que temos de escolher entre Deus e um deus admirado pela cultura de nossa época. Esse deus representa tudo aquilo que nos aproxima da vida material. É o caminho oposto que nos leva à estagnação e a não aprendermos as leis de Deus.

Do ponto de vista psicológico podemos entender que se trata da contradição entre o psiquismo consciente e o inconsciente, entre o exterior e o interior, entre o objetivo e o subjetivo, entre o objeto e o sujeito. Esses opostos são aparentemente inconciliáveis para a consciência, muito embora se encontrem unidos no inconsciente. O que a consciência separa, está, em realidade, indiferenciado no inconsciente. A evolução do Espírito é um processo que deve se dar de forma consciente, portanto percebendo a existência externa dos opostos a fim de novamente integrá-los. Devemos adquirir a consciência de que em tudo está presente o seu oposto, isto é, em qualquer afirmação, sentimento, objeto ou situação, é possível perceber seu oposto.

O Cristo chama a atenção para a impossibilidade de se viver os opostos sem integrá-los. Para muitos pode parecer a luta maniqueísta entre o bem e o mal, porém não se trata de opostos inconciliáveis, mas de uma unilateralidade da consciência. Nem o bem nem o mal têm existência real, pois são tão somente formatações resultantes da percepção humana das leis de Deus. As diversas culturas, e a civilização cristã em particular, estabeleceram preceitos e normas de conduta para que os indivíduos fizessem escolhas. A escolha  certa levaria ao bem, a escolha  errada levaria ao mal. Dessa forma, e para sobreviver no mundo, o ser humano aprendeu a  separar e confrontar os opostos, mesmo descobrindo depois que o que lhe parecia certo poderia estar  errado e vice-versa. O ser humano ainda não aprendeu a fazer escolhas. A maneira mais adequada de fazê-las deve recair sobre aquela que aponte um caminho que integre o que chama de bem e o que chama de mal.

O ser humano não deve simplesmente fugir do mal, mas inevitavelmente entender o porquê de atribuir qualidades negativas àquilo de que deseja fugir. Muitas vezes aquelas qualidades vistas fora dele são projeções de si mesmo. São inerentes à sua personalidade. Temer o mal é o mesmo que tapar o sol com um vidro transparente.

O Cristo afirma que não se pode servir a ambos simultaneamente, porém não declara que não se deve  seguir as riquezas empregando-as adequadamente. A escolha de um inibe a escolha do outro, porém pode-se fazer uma escolha que implique em optar pela espiritualidade sem negar a materialidade.  Cristãos de várias épocas fugiram das riquezas como se nelas estivesse o mal. Precisamos entender que é exatamente a dificuldade que se tem em administrar os bens materiais que afasta o ser humano de Deus. Na administração, com desapego, das riquezas materiais, apreendemos as leis de Deus.

As riquezas materiais são o símbolo do materialismo e do medo da morte do  ego. Em linguagem psicológica é o sinal do predomínio do  ego sobre o  Self. Do egoísmo sobre o desprendimento dos bens. O privilégio do egoísmo implica na abdicação do crescimento e da renovação interior.

Quem escolhe seguir a Deus, sem necessariamente desprezar a capacidade de aprender a administrar os  bens terrenos, sabe que o egoísmo é contrário ao amor, e este, por ser a lei maior, é que espiritualiza o ser humano.

Nosso psiquismo é dotado de uma motivação que nos leva a atitudes. Essa força interna nos impulsiona como se fosse uma energia motora. Ora nos leva a atuar para o mundo externo, ora nos leva a reflexões internas. C. G. Jung chamou isto de extroversão, movimento para fora, e de introversão, movimento para dentro. Algumas pessoas são extrovertidas, pois se deixam motivar mais pelo externo, outras são introvertidas e se deixam mobilizar mais pelos seus próprios conteúdos internos. Ninguém pode estar simultaneamente nos dois movimentos, porém pode-se fazê-lo em momentos diferentes. As duas atitudes psíquicas são desejáveis ao longo da vida do ser humano. Devemos ter momentos de extroversão e momentos de introversão. Não se pode servir aos dois senhores simultaneamente, mas pode-se entender que ambos são úteis à Vida.

A consciência e o inconsciente são opostos que devem se integrar para que o ser humano possa se realizar. Tornar consciente o inconsciente, de forma equilibrada e harmônica, é importante para o desenvolvimento espiritual do ser humano. Conseguimos tornar consciente o inconsciente na medida que nos aproximamos de seus conteúdos sem nos deixar sucumbir a eles. O Espírito é o senhor do processo evolutivo, o  ego é seu agente. Enquanto o  ego é o centro da consciência, o Espírito é o senhor de todos os conteúdos conscientes e inconscientes. A parcela inconsciente é maior do que a consciente. Sabemos mais do mundo externo do que de nós mesmos, pois priorizamos o que vemos fora em detrimento do que sentimos internamente.

Escolher a Deus, sem desprezar as coisas materiais, colocando-as a serviço d’Ele e utilizando-as como símbolo de realização externa para o equilíbrio e a harmonia do ser humano, é aplicar bem os  talentos que recebemos. É não se entregar à depressão e ao desânimo, nem acreditar que o mal nos ameaça a Vida.

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