INSEGURANÇA II - LIVRO: AS DORES DA ALMA (HAMMED)
Necessitar de amor, desejar consideração ou procurar segurança são desejos naturais e válidos. Uma certa quantidade de dependência emocional está presente em muitos relacionamentos, incluindo os saudáveis; efetivamente, juntos ou sozinhos, estamos sempre caminhando pelas estradas da evolução.
Para avançarmos pela vida de forma harmônica com as pessoas, devemos desenvolver a auto-estima, a capacidade de admitir erros, a responsabilidade de assumir nossos atos e, acima de tudo, a aceitação incondicional dos outros.
A insegurança faz de nossos relacionamentos íntimos um misto de irreflexão e precipitação, levando-nos a um excesso de confiança e, ao mesmo tempo, fazendo-nos perder o senso de nossas fronteiras individuais. Quase sempre, fazemos um verdadeiro e maranhado de nossos objetivos, desejos e conflitos com os de outras pessoas - pais, filhos, amigos, cônjuges. Quando essas nossas afeições mudam, seja porque estabeleceram um outra ligação íntima, seja porque, simplesmente, elegeram para si novos rumos existenciais, ficamos fatalmente desestabilizados e desesperados.
Carências ilimitadas nascem da insegurança, sufocando e afastando relacionamentos salutares. Muitas vezes, chegamos ao extremo de abdicar de nossos objetivos e vocações mais íntimas, colocando-nos em situações vexatórias, por termos deixado que nossa "porção fragilizada" falasse mais alto.
Inicialmente, fazemos um esforço hercúleo para nos entregar nas mãos da pessoa eleita. Com o passar do tempo, vamos ficando incomodados e desestimulados com esse relacionamento, até que, finalmente, chegamos ao ápice do desgaste, ficando raivosos e ressentidos com a pessoa de quem dependemos. Isso é compreensível, porque não há ninguém que goste, conscientemente, de ceder seu poder pessoal ou de renunciar a seus direitos de liberdade a quem quer que seja.
A intensa motivação que invade os indivíduos para serem amados e queridos a qualquer preço nasce das dúvidas íntimas sobre si mesmos, pois são pessoas que, raramente, podem se realizar na vida sem se "pendurar" no que chamam de grande amor.
A insegurança transborda de tal modo que transforma a natural necessidade de amar em uma necessidade patológica de satisfação, somente alcançada através da possessividade do amor.
Parte do desenvolvimento da personalidade humana é construída na infância e a esta soma-se milenar bagagem espiritual adquirida em outras encarnações. As bases de muitas indecisões diante da vida se devem à educação autoritária dada pelos pais, que escolhem, sistematicamente, pelos filhos, desde roupas, alimentos, esportes, brinquedos, férias, até amigos, profissão e afetos. Crianças crescem deixando parentes, companheiros ou professores decidirem por elas sem levar em conta seus gostos e preferências. Essas crianças se tornarão, mais tarde, homens sem segurança, firmeza e coragem de tomar atitudes perante a vida. O direito de decidir deve ser estimulado sempre nos menores, a fim de lhes fornecer apoio vital na formação de um sólido sentimento de determinação e firmeza, que refletirá no adulto de amanhã.
Indagou o Codificador do Espiritismo: " Que é o que resulta dos embaraços que se oponham à liberdade de consciência?". E a Espiritualidade foi taxativa: " Constranger os homens a procederem em desacordo com o seu modo de pensar, fazê-los hipócritas. (...)".
Essa hipocrisia não é propriamente intencional ou feita conscientemente, mas é quase sempre inconsciente. Não deixa, porém, de ser um modelo comportamental falso ou fingido da criatura humana, que se conduz de maneira diferente do seu jeito de ser e agir.
O constrangimento que se faz à nossa liberdade de consciência prejudica a busca de nós mesmos, a nossa afirmação perante a vida, bem como nos dificulta encontrar a peculiar forma de amar.
Em razão disso tudo, indivíduos passam a usar uma máscara de "bonzinhos" como meio de seduzir, conquistar ou conseguir disfarçar a enorme incerteza que carregam, mas, periodicamente, mostram de modo claro sua insatisfação interior: explodem em raiva inesperada contra aqueles com quem convivem. As relações ficam sensivelmente limitadas, pois nunca se sabe quanto a sua "bondade extremada" vai suportar uma opinião contrária ou algo que lhes desagrade.
Essas "estranhas bondades" são peculiares das pessoas que não desenvolveram a confiança em suas idéias, intuições e vocações íntimas e nunca se afirmaram em si mesmos. Não admitem suas insegurança e, por isso, a agressividade acaba quase sempre controlando suas reações. Vivem comportamentos irreais e simulados, tentando agradar a todos e fazendo da mentira uma necessidade para viver. Pagam, porém, um preço fisiológico, ou seja, a somatização das raivas e fragilidades que mantêm fantasiadas em candura e amabilidade.
Um comportamento exagerado de um indivíduo geralmente significa oposto do que ele demonstra e confessa.
Os inseguros vivem numa espécie de "heteronomia crônica", quer dizer, não escolhem as leis que regem sua conduta. Distanciados cada vez mais de uma vida autônoma , submetem-se a princípios e a pessoas diferentes de seu modo de pensar.
Usar a nossa própria intimidade para nos guiar, lançar mão de nossas sensações, emoções e sentimentos é a chave essencial que nos dará segurança.
Hammed - As dores da alma
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