domingo, 24 de abril de 2011

A depressão que ninguém vê

“Só aquilo que somos realmente tem o poder de curar-nos."  - C. G. Jung


Wanderley Oliveira
Conquanto o alarmante percentual de 15 a 20% de pessoas com depressão, conforme os parâmetros oficiais da medicina, tenho motivos de sobra para pensar que esse índice é assustadoramente maior, se considerarmos que existem as depressões que ninguém vê.

Costumo chamar assim as depressões “silenciosas” ou em estufa, quadros psíquicos que causam enorme sofrimento e que não são ainda diagnosticados oficialmente como doença. Na maioria das vezes, o paciente, e mesmo os profissionais de saúde mental, terão escassos elementos para analisar essa patologia com a atenção e os cuidados terapêuticos que ela exige. Possivelmente, a distimia, grupo F34 no CID 10, também conhecida como depressão crônica, seria a doença com maior proximidade das características dessa depressão silenciosa.

O quadro a que me refiro não é reconhecido como depressão clínica, pois as atividades cerebrais ainda não sofreram alterações a ponto de retirar do doente o controle emocional ou de causar mudanças preocupantes no comportamento. Todavia, a depressão que ninguém vê é capaz de tornar a vida de qualquer pessoa num autêntico inferno interior, com variações dolorosas no humor e outras dores que, em quase nada, a diferencia dos casos mais graves desse transtorno mental.

Podemos entendê-la como o efeito mental de alguns movimentos emocionais envelhecidos nas atitudes do ser ao longo de várias reencarnações. Esse quadro depressivo caracteriza-se por um estado psicológico de insatisfação crônica com a vida, decorrente da rebeldia em aceitar a realidade da vida como ela é. Essa rebeldia consolidada como hábito de conduta em múltiplas existências corporais, catalisa um amplo conjunto de variações emocionais que agride o equilibro do campo mental, provocando intenso sofrimento na alma.

A manifestação mais evidente dessa patologia é a inconformação, um estado afetivo que se estrutura a partir das contínuas reações de contrariedade ante às provas da vida. A inconformação se expressa em forma de raiva e depois, se não é devidamente elaborada, transforma-se em revolta. A revolta, que nada mais é que o desapontamento crônico, enfraquece a vida emocional facilitando o melindre, a irritação e o mal-humor. Esses estados, conjugados alguns deles, levam frequentemente ao pior resultado que está no entorno da depressão severa: a perda da vontade de viver.

Nesse estado, uma pessoa não faz planos de vida, deixa morrer seus sonhos, torna-se muito rígida, inflexível, tem uma compulsiva necessidade de controle, alimenta expectativas muito elevadas consigo e com os outros, desrespeitando todos os seus limites, adere ao costume da teimosia em seus pontos de crença e fica com seu afeto comprometido pela tristeza, pelo desânimo, pelo sentimento de abandono, pelo medo, pela culpa e menos valia; É um constante desassossego íntimo, uma ansiedade não se sabe pelo que ou por conta de que.

As consequências de todo esse conjunto de dores psíquicas e emocionais é a intensa desvitalização energética e muita angústia. No corpo físico surgem alergias, distúrbios endócrinos, cansaço crônico, insônia intermitente, infecções recorrentes, enxaqueca e outras múltiplas desorganizações.

Sob a ótica da reencarnação é uma depressão na estufa. Certamente a criatura está agindo desconectada do centro luminoso essencial, permanecendo em conflito sistemático entre os gritos da alma sábia e suas velhas bagagens ancestrais.

O tratamento de tais quadros, além da mesma rotina psiquiátrica e psicológica indicada para os casos severos da depressão clínica, deve ser complementado por um serviço de acompanhamento de educação emocional cujo objetivo será o aprendizado do paciente para gerenciar seu mundo emotivo.

A doença mental é  por demais agressiva às estruturas sutis do ser, para merecer somente medicações e psicoterapia como propostas terapêuticas. Os remédios tratam o corpo, a psicoterapia regula o psiquismo, mas fica faltando a essência, a alma. A cura real de todas as doenças está na intimidade de cada um de nós. O que ainda não sabemos é como acessar esses talentos e potenciais latentes na vida mental profunda.

Em meu modelo de tratamento complementar da depressão, tenho como foco a educação emocional do paciente para aprender a lidar com sua dor que muito antes de ser mental, é moral. Através da melhor compreensão do dinamismo emocional é possível criar um processo regulador das diversas fontes de energia em conflito na doença mental. Esse trabalho feito com acompanhamento é extremamente oportuno, considerando que nesse quadro doentio o inconsciente se encontra em erupção, subtraindo da criatura o que ela mais necessita, que é saber olhar para dentro de si mesmo com muita compaixão e sabedoria. O trabalho terapêutico começa cuidando do medo e da culpa, dois sentimentos muito importantes para o crescimento, quando se aprende o que eles querem ensinar.

Por que passar uma vida inteira de forma emocionalmente miserável? A vida é bela e viemos a este mundo para sermos tão feliz quanto possível.

Essa depressão que ninguém vê surge, porque não permitimos a expressão criativa de nossos talentos. Uma pessoa em depressão significa que há algo muito bom dentro dela precisando sair, ser expresso. No entanto, a atitude rebelde em não reconhecer o fluxo da vida, impede que essa manifestação divina seja colocada em ação.

Talvez só nos falte mesmo acreditar e saber que está em nossas mãos o direito e o dever de construir os caminhos para nossa felicidade. Minha missão é ajudar a sinalizar esses caminhos para que cada um de meus pacientes possa trilhá-los e achar o tesouro de seus talentos pessoais depositados na consciência.

Como diz Jung: "Só aquilo que somos realmente tem o poder de curar-nos." 

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