“Toda pressão espiritual nasce fora no desejo dos que anseiam nos assediar. Entretanto, o que esta pressão vai desencadear é uma questão de responsabilidade pessoal. Toda obsessão, invariavelmente, começa a partir da postura íntima de adesão aos desatinos que vem de fora. Pressão sofreremos sempre em se tratando da Terra. O que dela vai derivar é conosco. A pressão vem de fora. A obsessão vem de dentro.” - “Quem sabe pode muito. Quem ama pode mais.”, capítulo 9, página 134, Editora Dufaux.
Atendi uma pessoa recentemente em nossa Casa Espírita que tinha a seguinte queixa: “Às vezes tenho a sensação de que há algo está me prejudicando no ambiente de trabalho. Eu estou me sentindo frustrado com minha profissão porque parece que quanto mais faço, menos produzo. Funções que antes desempenhava com facilidade me causam fadiga e estou tomado por um medo inexplicável de perder o emprego. A memória tem falhado com frequência e um clima de irritação tem se tornado constante. E agora para piorar está aparecendo manchas roxas pelo corpo e todos os exames que fiz não deram em nada. Então uma amiga me disse que era obsessão e estou aqui para me livrar disso.”
Acompanhei esse caso por algumas semanas examinando se minha suspeita inicial poderia se confirmar. Encaminhamos a pessoa para tratamento espiritual, fizemos vários diálogos fraternos e não tive mais dúvidas sobre o diagnóstico, era puro estresse e não tinha sequer um obsessor na história.
Quando não sabemos o que está acontecendo por dentro de nós é muito comum chamarmos isso de obsessão ou dizer que são coisas da reencarnação passada. Embora não se tenha como contestar a veracidade desses princípios espíritas em nossas vidas, fica muito claro que conformar-se com essas duas explicações acerca de nossos conflitos, angústias e todo o conjunto de vivências íntimas que experimentamos é, no mínimo, uma atitude conformista de quem não quer ou não está dando conta de avançar na conscientização de sua realidade pessoal.
É muito simplista tentar explicar os fenômenos da vida emocional e mental com reencarnação e obsessão. É como se dessa forma suprimíssemos a responsabilidade pessoal e afirmássemos que são duas coisas que não tem como mudar ou com as quais nada temos a ver.
Em verdade isso é uma fuga. Impressiona-me como nós espíritas usamos esses dois temas abençoados do Espiritismo para tentar explicar ou mesmo justificar o que acontece conosco.
Outro exemplo típico é o casal que passa por momentos difíceis e conjectura que as desavenças, traições e desgastes ocorrem em função de vidas passadas onde um prejudicou o outro. E assim, mais uma vez, quando jogamos as explicações sobre nossos problemas para um “lugar desconhecido”, ao qual não temos acesso, novamente varremos para debaixo do tapete a sujeira que precisava ser devidamente cuidada no presente.
O autor espiritual, José Mario, em seu livro “Quem sabe pode muito. Quem ama pode mais”, tem uma fala curiosa e extremamente prática sobre esses temas, mais especificamente sobre a obsessão. Ele diz que a pressão vem de fora, mas a obsessão nasce em nós. Que verdade prática encerra esse ensino do amigo espiritual!
De fato, aquele estresse daquela pessoa que atendi tinha alguns componentes obsessivos tais como: o ambiente psíquico do seu grupo de trabalho, as companhias espirituais das pessoas que naquele grupo estavam com obsessão, a força dos pensamentos negativos de várias pessoas já exaustas com o que estavam fazendo, e tudo isso adicionado ao clima inamistoso dos clientes que por ali passavam e, sendo mal recebidos, descarregavam sua insatisfação em todos. Todos esses itens são, conforme a explicação de José Mario, apenas pressão. Pressão espiritual, psíquica, emocional e relacional. Entretanto, embora sejam elementos perturbadores, estão presentes na grande maioria dos ambientes da Terra. Quando deixamos que essa pressão seja mais forte que nossos cuidados pessoais de defesa, então a pressão se transforma em obsessão, isto é, somos dominados na vontade que se torna incapaz de reverter o processo. Aliás, esse é o conceito de Allan Kardec para a obsessão, no item 237, em O Livro dos Médiuns: “(…) obsessão, isto é, o domínio que alguns Espíritos logram adquirir sobre certas pessoas”.
Só é possível que as pressões vibratórias de fora interfiram de forma decisiva em nossas escolhas, venham elas de espíritos ou de outras fontes quaisquer, quando não temos governo sobre o que acontece com a vida interior. E não ter governo sobre si é ignorância, uma das piores doenças da atualidade. E se existe uma forma de ignorância fartamente nociva à nossa vida, ela se chama “analfabetismo emocional”.
O trabalho de amparo e orientação com o ser humano tem me ensinado muito nesse sentido. Creio que, tanto quanto de orientação espiritual, as pessoas estão carentes de orientação emocional para darem conta de seus próprios problemas. O nível de analfabetismo sobre a intrincada rede de emoções que tecemos no dia-a-dia é surpreendente. Assim como o Centro Espírita tem o compromisso de ensinar princípios espíritas, tem também o desafio de oferecer aos que lhe procuram, uma instrução direcionada para o conhecimento de si próprio. Não basta para isso abordar temas de auto-conhecimento com enfoque professoral. Estamos falando aqui de diálogo, oportunidade para falar de si, discutir seus próprios saberes e sentimentos. Transmutar a relação institucional dirigente-assistido e tratarmo-nos como seres humanos em aprendizado. Ter a coragem de largar o “salto alto” da instrução doutrinária e se conduzir como gente em busca de respostas e libertação.
Pois é! Enquanto não soubermos um tanto mais sobre nós mesmos, continuaremos declamando o poema da incompetência. Responsabilizando os outros, as obsessões e a reencarnação por coisas que estão à espera de nossa decisão corajosa por resolvê-las.
Talvez não seja exagero dizer que o nosso mais temível obsessor somos nós mesmos e que toda obsessão, embora venha de fora através das pressões de diverso matiz, é fecundada nas fontes profundas de nossa vida mental onde começa e onde também pode terminar.
Wanderley Oliveira
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